Vitória não é uma história qualquer

E falo sério. Não porque a história é uma ficção: não é. Não porque compõe um clichê: tudo menos isso! E sim porque essa história acontece, mas não com os papéis que você tá acostumado a ver na novela, livros ou até no seu dia a dia depois de ouvir aquela fofoquinha de bar.

Vitória, obra de de Giovanni Arceno, conta sobre Vitória e Danilo. Dois jovens adultos que depois de uma transa por pura diversão, descobrem que vão ser pais. Sem amor nenhum entre eles, não sabem o que será dessa criança, como funcionará as suas rotinas envolvendo trabalho e mesclando com um pouco de sonho do que eles querem realizar ainda futuramente em suas vidas. Eis então que ela decide que irá praticar aborto, mesmo que ilegalmente, e busca ajuda de Danilo, que não é um jovem pra lá de decidido, o contrário dela, que quando coloca uma ideia na cabeça, não há quem pudesse fazê-la mudar de ideia.

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Vitória é uma mulher mais velha que Danilo. Um pouco durona em tudo que faz e isso o torna a mulher mais bem decidida em toda história e que faz a mesma acontecer. Não tem um jeito meigo de se pronunciar perante a nada. Sabe o que quer, quando quer e onde quer. É bem teimosa o que faz a gente querer chegar e conversar com ela e pedir pra abaixar essa bola (porque sério, ô mulher complicada!).

Danilo se sensibiliza com toda essa história de gravidez, o que não é recíproco por parte da mãe da criança – e eu realmente gostaria de entender porque tanta grosseria. Nessa parte, acredito que o autor deveria criar (ou ter criado) uma parte no livro para contar a história da jovem, pois até onde entendi, seus pais são extremamente gentis e educados, coisa que a moça não demonstrou ser de forma alguma e não houve uma explicação para sua maneira de agir na história.

Danilo é um cara que tem 21 anos, trabalha na área de telemarketing e quando sabe que Vitória engravida dele tenta lidar com toda a situação da melhor forma possível. Ainda que exista um pouco de sentimento pela jovem, entende que está ali no meio da situação por causa da criança. É extremamente sensibilizado com o fato de vir a ser pai e faz o seu melhor pra se manter presente durante toda a gestação, até mesmo em ajudar a mãe da criança abortar, mesmo que ele não sinta que isso é certo. E por mais que a Vitória o queira longe e suma por bastante tempo preocupando Danilo, confesso que essa parte do livro me deu um tapa na cara.

Vejamos que normalmente numa sociedade onde o aborto é mais frequente por parte paterna, onde o pai simplesmente some, no livro é totalmente o contrário do que vemos. Danilo é tomado por uma sensibilidade paterna e quer ficar a par de tudo que acontece, até mesmo os efeitos do aborto sob o corpo da jovem, esta que, como eu disse não o quer por perto e nem se quer uma comunicação. Essa atitude de Vitória é um pouco incômoda pois parece que necessita de ajuda durante essa fase difícil da vida dela mas ao mesmo tempo quer que todos que estão sensibilizados com a sua história se afastem (me pegava pensando “poxa, Vitória! Cadê a consideração?”). O resto é história.

Outra coisa que acho importante falar é como uma gestação pode mexer com o psicológico materno, o que entra super em pauta a questão de aborto ser ou não ser uma alternativa à mulher. Ser ou não ser legalizado. Ser ou não respeitado o corpo da mulher. É interessante como Giovanni foi capaz de deixar essa questão em muitos detalhes da narrativa e que são só notadas assim que você for refletir sobre o tema.

Outro ponto que não devo deixar de passar é o protagonismo negro no livro. Poucas vezes lemos história na qual existe uma mulher negra que é muito dona do seu nariz e tem suas próprias decisões e que não seja subjugada pela sociedade. Vitória é totalmente o contrário. Devo dizer que até por este detalhe, deverá haver muita representatividade a quem ler a obra, além de a capa ser bastante chamativa no quesito.

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A narrativa do livro Vitória é feita sob os olhares de Danilo e composta por longos diálogos, onde muitas vezes você é capaz de se perder um pouco em quem está falando, mas nada que seja tão difícil de entender a história, inclusive esta foi uma das características que pega mais o autor e deixa toda narrativa menos maçante – mesmo que contenham menos detalhes na cena. O outro detalhe marcante são os palavrões e a forma mais informal de se comunicar na história, este é outro ponto que se parar pra pensar deixa o livro mais leve e fácil de seguir em diante. Toda aquela formalidade negada na história já uma característica bem forte quando falamos de Giovanni Arceno, este que possui alguns textos pela internet publicados que possuem esta mesma leveza presente em suas palavras, além de conter gírias sulistas, visto que o autor reside em Joinville, SC.

E justamente pela narrativa ser feita sob os olhos do Danilo, a gente tá submetido a entender tudo pela interpretação dele, não sabendo da opinião e o jeito de pensar da Vitória durante toda a história. Acredito que Giovanni deveria ter fortalecido mais essa parte. Vivi tanto a história que as vezes eu duvidei que ela fosse uma mulher tão grosseira e insensível tanto que às vezes nem a julgava, mas a pergunta que mais titubeava na minha frente durante todas as páginas é “por quê, Vitória?”.

Vitória é um livro sobre as pequenas derrotas: aquelas que nos impulsionam a viver.

Luiza
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Amo literatura, filmes de época, escrevo por hobbie e pesquiso porque sou mesmo curiosa. Vivo com a cabeça na lua e sou extremamente sonhadora. Amo ouvir história. E meu sonho é contá-las.

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